Praças da Europae e as suas histórias

A história das praças europeias está ligada por um fio histórico contínuo à antiguidade grega, onde aparece a plateia e depois a ágora. A praça urbana é específica da Europa, porque uma continuidade tão longa não está presente em outras culturas, mesmo que nessas também haja praças, algumas mesmo muito grandes. A Europa inventou a praça, desenvolveu-a como forma arquitetónica, para depois exportá-la para todo o mundo, principalmente durante o período colonial.

Enquanto nos seus primórdios a praça é um simples alargamento da estrada principal da polis grega, com o tempo, ela adquire funções comunitárias e religiosas e começa a ser embelezada. Dos gregos, a praça é assumida pelos arquitetos romanos, onde o fórum é fundamental na conceção do espaço. Após a queda do Império Romano, a vida urbana recupera na Europa apenas por volta do ano 900, quando muitos dos burgos medievais se desenvolvem por cima dos antigos assentamentos romanos, mantendo o seu plano e esquema de ruas, com o fórum transformado em praça central, tal como acontece em Zadar ou Porec, na costa dálmata.

Qualquer cidade medieval, fotografada por um drone, permite-nos ver a oposição fundamental entre a margem e o centro, porque as cidades medievais estão sempre rodeadas por muralhas. Algumas, como Óbidos, em Portugal, ainda mantêm essas fortificações intactas. A praça é um espaço amplo, opondo-se volumetricamente às sempre estreitas e sinuosas ruas das cidades. Quase obrigatoriamente, na praça medieval há uma catedral e uma fonte. Para as pequenas cidades, o papel da fonte também é funcional. Para as grandes cidades, o papel é puramente estético, a presença da fonte na praça estando ligada à tradição e ao ritual.

A existência das muralhas teve algumas consequências importantes para as cidades de toda a Europa Ocidental. Em primeiro lugar, o espaço limitado fez com que, durante séculos, a população fosse numericamente constante dentro das muralhas. Quando a população cresce, é preferível estabelecer novas cidades, em detrimento da expansão do recinto fortificado, e é por isso que a Idade Média é notável na formação de assentamentos. A construção começa sempre com o centro, com a praça, sendo o seu lugar fixado antes de mais nada. Uma segunda consequência importante da existência das muralhas: o centro permanece sempre o mesmo. Nessas comunidades, a praça está, em princípio, sobreposta ao centro geométrico. Era o espaço mais protegido e o sítio em que o inimigo chegava por último. Além disso, a entrada nas cidades é feita apenas por alguns portões. Automaticamente, todos os caminhos de entrada levam à praça central. A perspetiva aérea mostra que a praça é o ponto focal da cidade medieval. As muralhas marcam visualmente, o mais claramente possível, a oposição entre o centro e a periferia. Daí, outra consequência ao longo da evolução: quando, no alvorecer da modernidade, as muralhas são demolidas, essas cidades tendem a desenvolver-se não linearmente, mas concentricamente, adicionando uma sequência de terreno a uma estrutura já existente, estrutura ainda visível em muitas cidades europeias de hoje.

Na Renascença, a Europa herda as cidades medievais, que já não ama e as quer completamente diferentes: dentro de limites construídos, a Europa imagina outro tipo de mundos urbanos. Contudo, a época não é conhecida pela fundação de cidades verdadeiras, mas antes de cidades fictícias. No entanto, quando a teoria se transforma em prática, acontece mais como resultado de certas calamidades. A 21 de setembro de 1561, um grande incêndio alastrou a cidade de Valladolid. O infortúnio sofrido pela cidade é, para o urbanismo, uma verdadeira bênção. No lugar do espaço vazio é construída a esplêndida Plaza Mayor, até hoje uma das maiores praças de Espanha. É a primeira praça regular da Europa, hoje, injustamente, tão pouco conhecida. A sua simetria e o plano vêm-se muito bem de cima. O padrão arquitetónico e urbano estabelecido em Valladolid é adotado por muitas outras praças, atingindo a perfeição em 1729, com a Plaza Mayor de Salamanca, uma das praças mais bonitas do mundo. Só pela fotografia aérea podemos ver imediatamente que o perímetro da praça não é um quadrado, mas um trapézio. Ao nível dos olhos, a praça é percebida por qualquer passante, sem exceção, como tendo lados perfeitamente paralelos e iguais: uma subtil ilusão de ótica, cuidadosamente calculada para aprofundar a perspetiva e compensar o espaço relativamente pequeno que o arquiteto teve à disposição.

A partir do século XVI, ainda que continuem a ter fortificações, as cidades são pensadas de forma diferente. A missão de desenhar planos urbanos passa cada vez mais das mãos do artista/arquiteto para as mãos do engenheiro. O momento essencial de mudança dá-se no século XVII e está ligado ao nome de Vauban. O tipo de fortificação proposto por ele prevê o posicionamento de um grande número de soldados dentro das maciças muralhas da cidade. Os fortes em forma de estrela rapidamente se espalharam pela Europa, de Naarden e Bourtange, na Holanda, a Almeida em Portugal, ou Alba Carolina na Roménia. Essas cidades militares têm uma estrutura perfeita, com ruas retas e alinhadas, levando, obrigatoriamente, a uma grande praça, no centro. Do nível do solo, a perfeição dos fortes apenas pode ser intuída, especialmente porque os edifícios são muitas vezes austeros. No entanto, são de longe os mais belos assentamentos do continente que podem ser hoje fotografados do alto do céu, umas estrelas colocadas na Terra. Mais do que nunca, no caso dos fortes fica bem clara a importância da praça como espaço central.

Depois de meados do século XVIII e no século XIX, as cidades reinventam-se de tal maneira, que refletem as mudanças militares, tecnológicas, mas também políticas. O poder autónomo das comunidades urbanas enfraquece gradualmente, até o ponto de diminuir totalmente, em favor da autocracia dos monarcas. Os monarcas trazem os soldados para a cidade e os soldados precisam de ruas retas. Para agir rapidamente, mas também para executar lindamente os seus desfiles. Os aristocratas vivem cada vez menos nos seus palácios no campo, por quererem estar o mais perto possível dos centros políticos. Constroem as suas residências na cidade, que, com o tempo, se tornam nas suas residências principais. De repente, muitos deles ganham interesse pela aparência da cidade. Qual a consequência disso? O plano da cidade muda radicalmente. Inevitavelmente, o papel das praças e a sua relação com o resto do espaço muda também. Se os antigos assentamentos medievais têm uma estrutura baseada nas necessidades de toda a comunidade, as cidades mudam de aspeto para atender ao gosto dos aristocratas. Na área da estética urbana ocorrem transformações essenciais. Quando as ruas ficam retas, a perspetiva abre-se e as pessoas começam a ver mais longe, para além da primeira curva. Daqui para a teorização da vista é apenas um passo. A vista, desconhecida na antiguidade clássica, pressupõe uma visão urbanística muito mais complexa: os monumentos e as estátuas não devem ser vistos apenas de perto, atendendo ao facto de que são um ponto de referência mesmo quando estão no final de uma rua cumprida que, sendo reta, permite que o olhar aviste a praça de uma grande distância. O que antes era um efeito aleatório, agora está a tornar-se um elemento de estudo. Os arcos triunfais, as colunas comemorativas, as estátuas são construídas de modo a serem bonitas mesmo de longe. Daqui aos eixos cerimoniais que irão cruzar as cidades, ligando as praças, é só mais um passo. Lisboa, vista de cima, revela de relance as transformações ocorridas, sob a coordenação do Marquês de Pombal, após o devastador terramoto de 1 de novembro de 1755. As praças de Lisboa são um verdadeiro sistema. Avenidas largas e alinhadas ligam a Praça do Comércio ao Rossio, o Rossio à Figueira, ao Martim Moniz e aos Restauradores, os Restauradores à Praça do Marquês de Pombal, e todas têm no meio monumentos impressionantes.